Comunicado sobre os 15 moradores desalojados depois do acidente no prédio sito na rua 31 de Janeiro, nº55/57
5 de Maio
Passadas 8 noites após a derrocada do prédio nº55/57 da rua 31 de Janeiro, no centro do Porto, as 15 pessoas desalojadas continuam sem resposta permanente da parte da Câmara Municipal do Porto (CMP) ou da Segurança Social (SS). Sem ainda poder contar com qualquer tipo de responsabilização consequente por parte das entidades públicas, comunicamos o ponto da situação ao momento (5 de Maio, 10 h):
Situação dos moradores desalojados
Nesta altura, 9 moradores estão alojados no Seminário do Bom Pastor, em Ermesinde, após o contacto da Habitação Hoje (HH) com a Diocese do Porto que, dada a falta de resposta por parte das entidades públicas, se disponibilizou no dia 30 de Abril a acolhê-los temporariamente. Os restantes 6 moradores, que não puderam aceitar esta alternativa porque o seu horário de trabalho se estende para lá da hora de encerramento do abrigo, vão pernoitando junto da sua rede de proximidade, alguns através da relação que mantêm com o seu patrão, e ainda aguardam as primeiras respostas de emergência.
Os moradores fizeram um primeiro contacto com a SS, no dia seguinte ao incidente, a qual os informou de que, dada a sua condição de imigrantes, a solução teria de ser prestada pelo Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes (CNAIM), órgão do SEF. Ainda nesse dia, o CNAIM, instituição sem recursos para atribuir alojamento, fez uma sinalização formal para a sua assistência junto dos Serviços de Atendimento e Acompanhamento Social (SAAS) local. A CMP, contra o testemunho de todos os presentes, assim como do próprio CNAIM, negou a existência desse contacto. Depois de uma das vítimas se ter deslocado ao SAAS dia 2 de Maio, dia da reabertura do gabinete, foi possível obter confirmação por parte do mesmo que o pedido tinha sido recebido mas “perdido”. Apenas um morador esteve presente no gabinete do SAAS, ao contrário dos 3 que a CMP apontou. Lá, o morador foi recebido com promessas de apoio, mas saiu sem qualquer tipo de garantia. Durante a manhã do dia 3 de Maio, a SS contactou o seminário para pedir o reencaminhamento de 5 dos moradores para o CNAIM, visto que só 3 (mais a criança, que tem nacionalidade portuguesa) concluíram o processo de atribuição de título de residência, aparente condição necessária para a assistência dos SAAS (o casal e o bebé foram encaminhados para o SAAS Gaia e o outro morador para o SAAS Porto).
Dos 6 moradores que não ficaram alojados em Ermesinde, só 2 têm título de residência, e ainda que a CMP o tenha dito, não nos foi possível confirmar se esses moradores estão a ser acompanhados por qualquer SAAS. O CNAIM, sem competência para dar solução, contactou no dia 4 de Maio o CLAIM-JRS (órgão local do CNAIM, serviço jesuíta aos refugiados) que não tem alojamento vago para atribuir e pode apenas devolvê-los ao SAAS. O SAAS Gaia, depois de contactar com o casal a cargo da criança, comunicou que não tem solução habitacional e encaminhou-os para o mercado de arrendamento, com a promessa de apoio à renda. No final das contas, a SS e a CMP não assumem responsabilidade por pelo menos 9 das vítimas, 4 das quais ainda não têm qualquer solução e mantêm-se a viver de favor em locais que vão encontrando na sua rede de apoio. Não sendo provável que o processo de atribuição de título de residência possa ser acelerado a quem não o completou esta é, assim, uma cadeia de desresponsabilização por parte das instituições que só vai empurrando os moradores de uma entidade para a outra e, no final do dia, apesar da situação perfeitamente regular de todas as vítimas, apenas os deixa sem qualquer tipo de resposta ou solução duradoura.
Sobre esta conduta das instituições, deixamos a seguinte nota: ainda que a proteção de pessoas sem título de residência atribuído não seja expressa em nenhum diploma legal específico, não há legislação nenhuma que expresse o contrário. A única referência para enquadrar a conduta das entidades públicas neste caso será o art. 15º do título I da Parte I da Constituição da República Portuguesa que expressa “1. Os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português.”
Assembleia Municipal de 02.05
Na noite de 2 de Maio, houve 2 sessões da Assembleia Municipal, a propósito das quais a HH convocou uma concentração para dar continuidade à exposição pública deste caso e exigir o cumprimento das responsabilidades da CMP e da SS. Na segunda sessão da Assembleia Municipal, e depois da saída de alguns vereadores com pelouro, incluindo o presidente em funções nessa sessão, intervieram 2 dos moradores e uma representante da HH que acompanhou o caso e que foi interrompida e impedida de terminar a sua intervenção. Sem surpresa, as intervenções não se concretizaram em qualquer tipo de consequência que contribua para a solução dos problemas urgentes das vítimas que viviam e continuam a trabalhar no Município do Porto. Deixa-se a breve nota de que as intervenções dos restantes munícipes fizeram-se todas também em torno do tema da habitação.
Tanto durante a assembleia como depois, através de um comunicado na página de facebook do presidente Rui Moreira e no site da câmara, o executivo municipal procurou justificar o seu desinteresse e a sua desresponsabilização apontando para a ilegalidade da condição de 3 dos moradores. Esta afirmação entra em conflito com o registo do CNAIM realizado no dia seguinte ao acidente e confirmado de novo pela entidade no dia 3 de maio. Todos os moradores têm a sua situação regularizada, seja na forma de um processo iniciado por uma manifestação de interesse registada no SEF ou através da atribuição do título de residência. Esta não é a primeira confusão do executivo, uma vez que a CMP só no dia 2 de maio conseguiu finalmente admitir o número real das vítimas. Sobre o comportamento do executivo, apontamos também para a incompreensível acusação feita à HH de “aproveitamento político” sobre o caso e a sua colagem àqueles que o executivo considera como seus adversários políticos. A HH é uma organização independente e está apenas a amplificar as legítimas exigências dos moradores que, no final das contas, continuam sem resposta por parte de todas as entidades públicas que as podiam dar, isto depois de passada uma semana do acidente. O acompanhamento da HH aos moradores continuará até que as simples exigências dos moradores [: 1) atribuição de solução duradoura; 2) recuperação dos pertences ou indemnização pelas perdas através do 3) apuramento das responsabilidades legais pela derrocada do edifício] sejam cumpridas.
Estas exigências encerram somente o necessário para garantir a estabilidade que os moradores precisam para reconstruir a sua vida. Significando isto a probabilidade de, dada a sua condição social e económica, serem devolvidos às condições em que viviam antes do acidente, aproveitamos para exigir a disponibilidade da CMP para conhecer a verdadeira dimensão da realidade habitacional da comunidade migrante trabalhadora para poder atuar sobre ela, fiscalizando e regulando as situações de que este caso é mais do que representativo e acautelando as necessárias alternativas habitacionais dignas. Este é um esforço que consideramos urgente para, no mínimo, impedir que situações como esta se repitam.
JUNTA-TE À LUTA DOS MORADORES!
Fotografia: Paulo Pimenta